quarta-feira, 28 de abril de 2010

Brasileirice

Olho pra trás, percebo mudanças quase nenhuma.

― O que é isso companheira? ― ouço ao pé do ouvido, de alguém que lembra Guevara.

― Há revolução. - disse-me.

― Mudanças poucas. Pus-me a desfiar. Dessas, o perfil de “Che”, às vezes ao vento, sobre a motocicleta, sempre de boina de estrela solitária, estampado em malha de grife pra burguês comprar, customizada, superfaturada, no shopping. Shopping leva aspas pra indicar estrangeirismo? Não importa. Não há brasileiro que resista a um, e além do mais a Língua Portuguesa já o engoliu mesmo! E por nisso falar, quantos sapos temos que engolir ao dia? É que engolir sapos faz mal, melhor mastigá-los antes. Autonutrição também pode prejudicar a saúde, então é bom consultar um médico. Chegar numa dessas casinhas de “saúde”. Acontece que eles estão na vasta lista dos desaparecidos; vez em quando vejo um, no poste, desbotado pela ação do sol e da chuva - casamento de viúva. E eu não casei nem a primeira vez ainda. O quê que a viúva tem que eu não tenho? Falando em tempo: os meteorologistas anunciam mudanças bruscas no clima; fortes ventos e tempestades devastadoras. É o efeito estufa. É bom Noé pôr as barbas de molho. Não é? Não lembro se ele tinha barba. Por via das dúvidas é melhor deixar crescer. E se fosse preciso uma nova arca, será que o Brasil teria alguma chance de levar alguns. A Xuxa, o Pelé, alguns monstros da televisão. Ai que medo! Fernanda Montenegro, talvez, mas o Fernando, o marido, não; nem os ex, presidentes, Collor e Henrique; talvez o partido da vez, o PT... Por falar em PT, nunca mais vi. Se tiver notícias mande pro meu endereço eletrônico, ou e-mai”, se assim desejar. Recebi um, semana passada. Fiquei chocada – não que possua gene galináceo. Ao fazer o download apareceu a fotografia de um homem com suas vergonhas de fora; sua pele não era parda, nem seus cabelos tosquiados, mas tinha boa figura, bom nariz e boa vergonha e cabeça chata. Eu vi que ali, se chegando, rolava. E como rolava! Havia uma frase escrita bem no rodapé: made in Ceará. Foi no dia em que estava triste e deprimida porque meu plano de carreira nunca me alcançaria, amputaram-lhe as pernas quando aprovado, à revelia, então quis renovar amizades, espairecer; foi quando conheci Man, pela internet, um cearense com jeitão de striper. Juro que só pensei na amizade, mas depois que vi suas vergonhas... A princípio corei, com vergonha; não mais quando soube que minha carreira “magistérica” havia acabado de falecer. Não havia mais do que se envergonhar. Eu era apenas uma letra e um número numa tabela mal-feita, subfaturada. Lembrei de minha infância, tenra infância, quando pulava amarelinha – feito Saci - tentando me equilibrar naqueles quadradinhos pra alcançar o céu. É assim que me imagino, tendo de me equilibrar, de três em três anos, pra pular no quadradinho seguinte da amarelinha escolhida por mim. “O céu é o limite” – nunca ninguém voltou pra confirmar - mas é bom aproveitar o purgatório porque o céu é distante, e o diabo do caixa eletrônico só vive lotado e com limite de saque. Pra quê limite? Mas não é tão ruim assim o meio do caminho; existem as pedras que temos de acertar antes de pular, e se a gente encontra um Man pelo caminho... Largo, se for uma avenida; mas se for rua de invasão é bem estreito. Nesse caso contrarie as leis de Deus, ao caminhar escolha o mais largo, é menos perigoso. As feras humanas ficam a espreita nos becos e vielas, aguardando sua presa. Enquanto isso, pulando vou, amarelinha e desnutrida. Mas os meus cabelos, ainda não os alisei. São encaracolados e rebeldes, indomáveis como o meu espírito. Sigo numa sala quadrada, de 6x8, às vezes menor, com carteiras azuis, mesinha quebrada, apagador velho, pincel roto, paredes pichadas, engolindo sapos, de todo tamanho, e um sonho, de padaria, daqueles bem grandes. O bom é que às vezes, próximo ao final do mês, junto-me aos iguais e vou tomar um chope enquanto a cirrose não vem; enquanto o céu não chega... enquanto não vem o último suspiro. Mmmm, que delícia, adoro suspiro!

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