Glória e Lívio se conheceram pela internet. Muitos encontros virtuais até a primeira vista. Foi no estádio, porque disse ela adorar futebol. Tudo mentira. Não quis arriscar perder mais um namorado. Todos eram fanáticos. Ela, por sua vez, não conseguia esconder o desinteresse, por isso sempre ficava sozinha.
Disputa entre São Raimundo e Nacional. Teve que aprender todas as regras do jogo, decorar os nomes dos jogadores, dos times mais importantes, dos campeonatos, a geografia e a geometria do campo, e as expressões usadas durante as narrações.
Combinaram ir com a blusa do time. Ele era São Raimundo. Pra mostrar sua personalidade autêntica disse ela ser Nacional “roxa”, seu time do coração. Cuidou de ir correndo comprar a blusa e acessórios numa loja do Centro. Que surpresa. Reconheceu o Lívio, ele havia ido comprar a blusa dele também. De longe observava.
― Tem a blusa do São Raimundo? – perguntou à vendedora.
― Tem sim.
― Qual é?
― Você não sabe? É essa aí do mostruário, a sua direita.
― E qual é a do Nacional?
― Essa outra, do lado.
― Ah! Quero uma.
― De qual, São Raimundo ou Nacional?
― Espera. – Lívio não lembrava de qual time gostava, aliás, de qual time havia dito que gostava. Acabou levando as duas, dizendo ser uma dele e a outra, presente.
Glória esperou que ele desaparecesse na esquina. Só então se aproximou.
― Tem a blusa do Nacional? – perguntou à vendedora.
― Tem sim.
― Qual é?
― Você não sabe? É essa aí do mostruário, a sua esquerda.
― E qual é a do São Raimundo?
― Essa outra, do lado.
― Ah! Quero uma.
― De qual, Nacional ou São Raimundo?
― Espera. – Glória também não lembrava de qual time gostava, aliás, de qual time havia dito que gostava. Acabou levando as duas, dizendo ser uma dela e a outra, presente.
― Acho que já vivi isso antes. - pensou alto, a vendedora, de mão no queixo e olhar levemente diminuído, tentando focar o close na memória.
Teclaram-se ainda muitas vezes até o encontro. Combinaram o local exato. Seria no domingo, às 16:00h. Não foi problema se reconhecerem, já haviam trocado poses. E ela já o tinha visto na loja. Ambos estranharam os trajes. Nenhum dos dois vestira a camisa. Falaram-se meio sem-graça.
― Por que não está com sua blusa? - quis saber ela.
― Você também não.
― É por causa da violência. É tão comum...
― É. Eu também.
― Vamos entrar, aí a gente troca.
Saíram dos vestiários. As blusas trocadas. Ela São Raimundo, ele, Nacional. Ambos se olharam e se riram. Ainda bem. Porque nem ela, nem ele entendiam muito de futebol. Lívio mentira porque todos os garotos de suas relações gostavam de futebol e não queria decepcionar Glória. Ele também havia estudado muito sobre o esporte. Então combinaram muito. Vibraram juntos cada lance. Atentos à narrativa torciam com tanta paixão que pareciam torcedores desde sempre. Viveram intensamente aquela final. Decisiva. Foi o marco da paixão, à primeira vista, pelo futebol. O resultado deu empate. Aquela foi a primeira de muitas partidas. No dia dos namorados deram-se camisas, aquelas, compradas para a primeira vista.